De onde os sonhos vêm: Abrindo um canal

Este é o segundo post da série. Espero que façam o exercício e gostem dos resultados

Escrever nem sempre dá prazer, muitas vezes dá agonia.

Você ama a ideia de escrever um livro, mas deseja imensamente que sua ideia já estivesse escrita. Escrever pode ser um fardo.

Só que você não entende por que sente isso. O que está dando errado. Não é isso que você mais adora fazer? Sentar na frente do computador ou do papel e despejar a criatividade? Por que escrever subitamente inquieta, te tira do centro, aborrece, e finalmente, desaparece da sua vida?

Por que escrever se torna mais uma tarefa. E tarefa temos muitas.

Sempre que alguém coloca a escrita em sua lista de obrigações, uma faísca criativa se apaga no mundo (no seu mundo).

“Mas o NanoWriMo funciona”, você argumenta. E funciona mesmo, já escrevi um livro inteiro em um mês. Digo além: às vezes, se não nos forçarmos um pouquinho, a escrita não sai. Ambos os lados são verdadeiros.

Ainda assim, uma faísca de inspiração se apaga.

A primeira coisa para burlar o bloqueio é interiorizar esse paradoxo: escrever livremente é o jeito que a inspiração gosta de se exercitar; escrever metodicamente (ou com alguma estrutura) é a forma de fazer a escrita acontecer (às custas de seu desbotamento). Não há, como nada na vida, ganho sem perda. Se tendemos mais para o lado da obrigação, lâmpadas vão se apagando à beira do caminho. É um efeito acumulador, que vai deixando o trajeto mais escuro e cansativo. Se deixamos a inspiração solta, uma história pode se perder no caos. O que fazer, então?

Assim como os budistas, devemos escolher o caminho do meio.

Existe um meio termo entre essas duas escritas que permite manter a inspiração e as letras fluindo, mas para isso você vai precisar ser sereno e esperto.

Sereno para chegar até a porta que separa você da usina de sonhos.

Esperto para driblar o censor que guarda essa porta.

Um dos modos de achei para chegar lá (sou do tipo estruturado tentando não deixar as lâmpadas queimarem) foi esse exercício-poção-mágica: Fez, sentiu a diferença.


Durante o dia, de preferência antes do horário em que costuma escrever, sente-se na frente do papel e feche os olhos (não pode ser da tela). Inspire profundamente e tente ouvir a batida do coração no peito. Quando encontrá-la, tente combinar a batida com a sua respiração. Tente fazer os dois funcionarem em um só ritmo, como uma música. Inspira-batida-batida-batida-expira. Atente ao ritmo que eles formam. Quando ambos estiverem em completa harmonia, abra os olhos, pegue a caneta e rabisque o que está sentindo. Comece com “Eu Percebo….” E escreva a percepção que vier à mente. Qualquer cosia, sem censura. Não se trave, ou pense “mas isso não está fazendo sentido.” É para não fazer, mesmo. Escreva até ter colocado tudo que percebe ao seu redor.

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Explicação: Temos uma parte oculta em nós, e ela é real. Essa parte é a nossa fábrica de sonhos, das imagens que queremos transformar em palavras. Mas ela só fala conosco se atravessarmos um limiar, onde um censor (nossa mente racional) guarda a entrada. Essa parte inconsciente de nós se alimenta de nossas percepções sensoriais e das memórias carregadas de sentido. Precisamos alimentá-la se quisermos ter acesso a ela. E, claro, despistar o censor.


Escreva o que vê, sente, cheira e nota nos arredores, da maneira mais ráida possível (antes que a mente te diga que isso é besteira). Em seguida aprofunde o exercício conectando as sensações com o que trazem à sua memória. “Ouço o barulho de carros. Lembro da rua onde nasci, da cama que ficava rente à janela. Lembro da sensação de …”


Após essa expulsão de memórias, o censor deixará uma fresta da porta que guarda. Aproveite essa fresta. Pule imediatamente para a sua história, vá para o arquivo ou o caderno onde a guarda e repita nela o que acabou de fazer. Entre no mundo do personagem como entrou no seu. O que ele pensa, ouve, se lembra?

Não se esqueça que, para sua escrita ser real, você precisa passar por isso. Chegar realmente lá embaixo (ou em cima), dentro da sua alma. Você precisa saber o que é ter esse canal aberto. Sem autoconhecimento, você jamais acessará esse mundo mágico.

Continue seguindo a luz (e conte aqui como foi o exercício para você!)

Com amor,

Karina

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